quarta-feira, 8 de abril de 2020

Carta para Davi

Filho,
Já há uns dias tenho tentado parar e escrever, incrível como que mesmo em isolamento e de quarentena, com todas as oportunidades de sentar e refletir, a mamãe não consegue.

Calma, vou te explicar essa maluquice de isolamento que acabei de falar.
Mas antes de chegar nessa parte, que já é quase o final, vamos começar do início.

Primeiro, quero que saiba que vc foi muito desejado, planejado, foi quase que “programado” estrategicamente para vir quando veio.

Quando sua irmã nasceu, a mamãe achou que ia surtar e por um bom tempo não conseguiu imaginar a vida com outro bebê. ( hoje não sei ao certo dizer se ela deu um pouco de trabalho ou se eu sou exigente demais e sempre me cobrei tanto que acabei ficando sobrecarregada e exausta)

Mais graças a Deus as coisas foram chegando no lugar, eu fui me aceitando como uma mãe que também erra e que se frustra e sua irmã começou a sentir falta de companhia em casa também.
Ela já estava mais independente, mais fácil de controlar e aproveitamos que tínhamos energia para encarar outro bebê e começamos a pensar na ideia.

Primeiro tive que esperar um diagnóstico benigno para um nódulo que tirou minha paz por uns 8 meses, não poderia arriscar e ter você no meio da dúvida.
Em março depois de algumas tentativas de uma biópsia, a mamãe fez um procedimento cirúrgico, e graças a Deus foi só um susto e uma nova cicatriz.

Tínhamos uma viagem em Maio e mamãe queria um pouco de liberdade para poder curtir sem o medo de colocar vc em risco. Então esperamos mais um pouco.

Na viagem mesmo comecei a perceber que tinha algo estranho com meu organismo porque há quase um ano sem o DIU, meu ciclo era curto porém eu ficava mais de 15 dias menstruada.

Foi um instinto mesmo, sempre conheci muito meu corpo, e isso começou a me deixar um pouco ansiosa porque, como filha mimada e muito apegada aos meus “planejamentos”, eu vi que essa gestação poderia demorar um pouco e eu não queria que você e Olivia crescessem tão distantes;
Fui em busca de médicos, até para me preparar para engravidar.
Em um desses médicos, me sugeriram um acompanhamento de ovulação porque tudo indicava que eu estava ovulando mas que talvez com o ciclo bagunçado.
Acompanhamento iniciado, muita ansiedade todas as vezes que ia e que o médico falava que nada havia acontecido.
Depois de 10 idas para acompanhar se havia ou não ovulado, havia uma possibilidade que eu tivesse ovulado 12 dias depois do esperado, uma ovulação super tardia.

3 dias após esse dia, um sangramento que indicava a volta do período menstrual. Eu estaria ovulando e menstruando em um espaço de tempo muito curto.
A médica sugeriu que para engravidar talvez tivesse que tomar uns hormônios nos próximos meses para regularizar o organismo, ter tempo normal de fecundar.

Eu não queria tomar hormônio, por toda aquela questão com o nódulo do ano anterior... orei, fiquei um pouco ansiosa mas confiei que deixaria fluir até o final do ano...

Passaram alguns dias daquele sangramento, e ele parou bem antes dos 15 dias esperados. Mais uma vez, eu conhecendo mto bem meu corpo pensei que tinha algo errado...( e se não fosse um sangramento de menstruação, e sim de nidação??) a médica não acreditou porque teve muito volume e 3 dias de duração...difícil.

Mas parou total com 3 dias, e eu curiosa, resolvi fazer um teste. Isso era uma sexta. O teste não deu nada.

-Relaxa e tentamos de novo no próximo mês sem essa neura de acompanhar ovulação, vou deixar fluir- pensei.

No domingo me senti estranha, eu já tinha me sentido daquele jeito antes. Era como se pudesse perceber meu corpo me mandando algum sinal.
Na segunda fui jogar o teste fora antes que alguém mexesse nas minhas coisas e visse e pensasse “ por que essa louca está fazendo teste”?!

Quando peguei no teste uma surpresa: estava POSITIVO. Pesquisei e vi que após alguns dias isso poderia acontecer...mas eu tinha que tirar a dúvida né?!
Comprei um teste e umas 3 horas depois consegui estar sozinha para fazer ( ainda achava que se contasse a história para alguém iriam me chamar de louca). Resultado: POSITIVO.

Respirei, liguei para a médica que disse que com aquele sangramento todo eu poderia ter engravidado, perdido e o organismo reconheceu o hormônio.
Pediu para esperar, fazer os exames de laboratório e aguardar 2 resultados positivos de sangue.

No domingo tinha sido dia dos pais, eu queria contar pro Vi, mas e se não fosse real; não seria um presente e sim uma frustração...

Fiz o exame de sangue ainda na segunda e mais uns 2 de farmácia. Todos positivos.

Na terça de noite contei para ele, expliquei a situação e falei que juntos iríamos entender a vontade de Deus, e que seria egoísmo meu guardar aquilo só para mim até se confirmar.
Não perdi a oportunidade e fiz uma surpresa para contar, fiz daquele momento uma coisa nossa especial.



Na quarta repeti o exame de sangue e recebemos outro resultado positivo.

Comemoramos e resolvemos aguardar um pouco para contar para nossas famílias. A avó dele estava internada e não vimos naquele momento uma oportunidade feliz para comemorar aquela novidade.
Indo visitar a vozinha do Vi, estava doida para contar para ela que teria mais um bisneto, mas nem o Vi sabia ainda, fiquei la me segurando.

E decidimos também esperar o ultrassom.
Ah esses ultra-sons. Sempre uma emoção, e no nosso primeiro, não ouvimos coração, o médico suspeitou de uma gravidez sem feto.

No mesmo dia a vozinha do Vini foi descansar.

Eu não dei conta e pedi para contarmos na minha casa, e no FDS contaríamos na casa dele.

Surpreendemos a todos aos poucos, literalmente surpreendemos porque todos estavam acompanhando a “ladainha” da ovulação tardia e ninguém entendeu nada quando aparecemos grávidos rsrs.

Com 8 semanas ouvimos o coração do baby, e enfim respiramos, e o nosso voltou a bater normalmente e menos apreensivo.
Contamos então aos amigos próximos e aos poucos fomos divulgando as boas novas.
Fiz um vídeo com a reação de algumas pessoas:
https://www.youtube.com/watch?v=Wsk_JSZKbxM

Ainda no início da gestação passei por um dos meus maiores desafios profissionais, a empresa tomou outros rumos, assumi novas funções, responsabilidades e quando achei que teria uma gravidez mais light onde eu me permitiria aproveitar e descansar mais, fui envolvida pelo trabalho e consumida por muitas novas atividades.

Essa foto foi em novembro, data que marcou o final/inicio das mudanças profissionais dentro da empresa. Foram meses antes de planejamento e muitos desafios a partir dali que continuam surgindo.


E em algum momento, que não lembro bem quando, eu decidi que diferente da gravidez da Olívia, onde eu permiti que o medo me consumisse e que a ansiedade que me trouxesse muita inquietação, eu não deixaria nada do mundo externo tirar o sossego e a leveza da nossa relação. Essa gestação tinha um tema para mim, que a tia Bruna conseguiu colocar em frase quando estava me ajudando a desenhar o quartinho: QUE SEJA LEVE.

Naquele momento o mundo estava exigindo muito de mim diariamente, sobrecarregada, cansada, lidando com mil conflitos profissionais, me sentindo frustrada como mãe, como esposa e até comigo mesma. Me sentia falhando em vários aspectos, mas me esforçava para manter minha cabeça e meu coração leves para deixar vc confortável e longe de todos esses meus conflitos internos.

Com 11 semanas casamos a tia Kaka, minha melhor amiga. O dia todo em pé, fui a última a deixar a festa e não deixei de aproveitar esse dia tão especial.


Na mesma semana, 3 dias antes do chá revelação, eu levei um tombo na porta do trabalho, praticamente varri o chão com a barriga.
Respirei e confiei, no sábado fui madrinha de outro casamento especial, mesmo com a barriga super dura o final de semana inteiro.
Sabrina no meio de duas grávidas, mulheres,amigas, sócias e "empoderadas" no casamento da Pit; 

No domingo, recebemos mais de 100 pessoas para o momento revelação, nosso bebê tinha cor, era AZUL.
Mar de gente para descobrir se você seria boy or girl!


Com 17 semanas enfrentamos uma cirurgia para a Olívia, retirada das amígdalas, adenoide e colocar um carretel no ouvido, preferimos fazer antes do Davi nascer pois era uma cirurgia de recuperação bem chatinha.
Foram alguns dias sem dormir, dando muito colo e dengo para a nossa primogênita.
Foram dias de ansiedade, um pouco de medo e de questionamentos sobre minha posição como mãe naquela decisão ( hoje avalio como uma das melhores coisas que já fiz pela Olívia, ela é outra criança, graças a Deus por essa direção na hora certa.)
Olívia no hospital se recuperando da anestesia.


Com 19 semanas, fui dirigindo para uma das nossas unidades próximo a Sete Lagoas, e fiz uma das maiores loucuras como motorista na minha vida: literalmente joguei o carro dentro de um buraco com quase 2 metros de altura.
Um susto, uma engenhoca muito maluca para tirar o carro do buraco ( literalmente com um trator), uma viagem de reboque e um pára-choque estragado, foram algumas aventuras desse dia.




Precisávamos de férias, e depois desse episódio tive certeza que precisava parar um pouco.
Dependíamos do OK do médico da Olívia para liberar por conta do pós cirúrgico, graças a Deus, liberada! Liberados, no caso.

Em uma semana resolvemos e fomos descansar uns dias na Bahia. E ainda tive o privilégio de uns dias na roça e apresentamos a Olívia para a Bisa na companhia do vovô e da vovó. Foi um oásis.




Voltamos e dois dias depois passamos por toda a tensão da cirurgia da Ninha, e dois dias depois da mamãe. ( as duas fizeram procedimentos parecidos em situações completamentos diferentes, a Ninha a retirada dos ovários, útero e trompas e uma limpeza de um tumor que estava crescendo. A mamãe a retirada das trompas, ovários e útero , na prevenção de que um dia esses órgãos pudessem ter tumores, uma vez que ela já lutou 2x contra um câncer de mama e em um exame genético deu algumas possibilidades para outro câncer)

Era hora de dar colo e cuidado para elas.

O mês de dezembro passou assim, tentando recuperar o peso ganho das férias, as dores na lombar, cuidando da mamãe, dando suporte mais emocional para a família do Vi já que a Ninha estava cercada de “cuidadoras”, de muito trabalho na empresa com as sócias de licença e de férias, me virando com as férias da Olívia, e respirando para não surtar.
Nossa tradicional foto de final de ano.


No ano novo estava me sentindo tão cansada, tão frustrada, tão sozinha... encerrei o ano com um sentimento de fracasso estranho. Talvez envolvida de tantos hormônios, talvez cansada, mas me sentindo uma péssima mãe e uma péssima esposa, com uma sensação de que eu tentei abraçar o mundo e no final das contas não dei conta de nada. Chorei.

Mas mais uma vez, tentava te proteger disso tudo e levar a gravidez com mais positividade, mais leveza, talvez por isso deixei muita coisa para última hora, porque não conseguiria naqueles momentos envolver você e toda a parte deliciosa da gestação de planejamentos,sonhos e construção de ideias nesse meu mar de frustrações.

2020 chegou e com ele aquela expectativa de que as coisas seriam renovadas. Aos poucos fui me permitindo deixar alguns pesos pelo caminho e focar no que era importante e primordial naquele momento.
Foquei em terminar o enxoval, o quartinho, as lembrancinhas e deixar tudo pronto para quando você chegasse.

Ainda bem que o mês de janeiro pareceu ter 90 dias, porque consegui correr e aos poucos recuperar meu tempo perdido.

Filho, final de janeiro uma chuva surreal invadiu nossa cidade, parecia cena de fim do mundo, o que eu não imaginava era que as coisas ficariam mais apocalípticas ainda nos próximos meses.


Fevereiro foi curto e com direito a uns dias na fazenda e chalé para descanso e curtirmos a família.
Farm days


Quase todos os bebês que que vc conheceu ainda na barriga já estavam do lado de fora: Miguel, Dedé, Clarinha, Bianca, Flavinho, Marina, Dom...aos poucos todos foram chegando e aumentando a ansiedade da mamãe em te conhecer logo tb.

Aí chegou março, agora eu volto no começo da nossa história onde posso dizer que enfrentamos a fase mais desafiadora de toda a nossa gestação.
Logo após meu aniversário, fomos invadidos com as notícias do Covid19, vc com certeza ainda vai ouvir MUITO falar disso, e mais ainda porque vc foi um bebê que nasceu no meio dessa pandemia.

Eu não sabia, que ironicamente, era um isolamento que eu, seu pai e sua irmã precisávamos para ficar mais juntos, mais conectados. Foram dias de muito trabalho ( chamamos de home office), faxina, cozinha, colo, limpeza, organização, e aprendizado.

Hoje, após 22 dias de quarentena, eu consegui enfim parar e escrever com mais calma sobre nossa trajetória nos últimos 9 meses. Não foram 22 dias fáceis, mas de muita união e reflexão...
Por aqui todo mundo ajudou a mamãe barriguda na faxina


Mascaras e álcool em gel marcaram esses dias

Teve muita bagunça também...


Estamos em abril e a qualquer momento você chega. Tivemos que mudar nossos planos em relação a hospital, você não poderá receber visitas, não teremos fotógrafos, doula, a vovó para acompanhar, as dindas para ajeitar o quartinho do hospital, aquela bagunça de sobe e desce e de gente disputando para te pegar no colo, aquele momento da Olívia indo te conhecer no hospital...

O que temos no momento é um monte de dúvidas, e apenas uma certeza: que eu e seu pai estaremos inteiros e completos para receber você, sozinhos, e todo esse tumulto a que te condicionei nesses últimos 9 meses, será substituído pelo sossego de apenas nos 3.

E quando chegarmos em casa , manteremos nosso isolamento apenas nos 4, sua irmã vai te conhecer e tenho certeza que ela trará tanta paz e carinho para o seu ninho, que você se sentirá perdido longe dela.

Quando escolhemos Davi para te nomear, não imaginava que vc já teria tanta semelhança com o Davi que me influenciou na escolha, o pequeno Davi da Bíblia que se tornou um dos maiores guerreiros da história e um grande Rei.

Você que se comportou tão bem a gestação inteira, mesmo enfrentando tantas batalhas comigo, vc já vai nascer um verdadeiro guerreiro.

Seguimos aqui na expectativa se você vai vir ao mundo quando escolher ou se vamos ser obrigados a te tirar daí rsrs imagino que vc está adiando o quanto pode para enfrentar essa loucura que se chama mundo, em plena pandemia, com tantas incertezas, com muito cuidado e cheiro de água sanitária e álcool em gel.

É tão bom saber que existe um Deus que cuida de todos esses detalhes e de todas as nossas frustrações, é tão bom saber que mesmo que eu erre, ELE NÃO ERRA.

Ele nos surpreende, nos cuida, nos ampara, nos sustenta, nos protege e nos ensina com todas as situações que enfrentamos.

PARTO e chego ao fim dessa gestação mais madura, mais calma, mais confiante, mais completa.


No meio de tanta coisa pesada, eu aprendi a ser leve.

A dar conta do que preciso na hora que consigo, sem tanta cobrança, sem desperdiçar energia com coisas ou pessoas que não deveria, a respirar e a parar.

Fico ansiosa pensando que horas você vai chegar, hoje acordei e te disse que você já pode vir, estamos prontos? Nunca estaremos... mas estamos preparados!
E confiantes que Deus tem a hora de todas as coisas...
Foto de hoje, com 39 semanas, dando uma fugidinha do nosso isolamento para fazer atividades na casa vovô.


Vem filho, a sua irmã me ensinou e me mostrou o quanto Deus é bom, e agora você vem e me ensina que Deus não é apenas bom, Ele também tira de nós nossos medos e pesos, e torna tudo mais leve.

“ é Meu somente Meu, todo trabalho, e o seu trabalho é descansar em mim...”

Queria registrar aqui um pouco do que foi a loucura desses últimos meses, para quando você crescer a gente lembrar e recordar juntos de como Deus está sempre cuidando da gente, até nos pequenos detalhes...

4 comentários:

  1. Aaaaah, lendo e chorando.
    Deus de detalhes, sempre!
    Tanto orgulho de você, amiga. Tanto amor por vocês!
    Venha Davi, receber esse amorzão todo aqui do lado de fora!! ♥

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  2. Nique, que relato, que história, quantas aventuras em meses. Emocionada aqui; como sempre fico quando leio o que você escreve. É lindo perceber o cuidado de Deus com a vida de vocês e como você sente e transborda isso. Seja bem vindo a esse mundo externo, Davi! Davi, já te conto uma coisa: seus pais são maravilhosos e sua irmã é pura meiguice! ❤️����

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  3. Nique, que relato, que história, quantas aventuras em meses. Emocionada aqui; como sempre fico quando leio o que você escreve. É lindo perceber o cuidado de Deus com a vida de vocês e como você sente e transborda isso. Seja bem vindo a esse mundo externo, Davi! Davi, já te conto uma coisa: seus pais são maravilhosos e sua irmã é pura meiguice! ❤️

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  4. Nique, que relato, que história, quantas aventuras em meses. Emocionada aqui; como sempre fico quando leio o que você escreve. É lindo perceber o cuidado de Deus com a vida de vocês e como você sente e transborda isso. Seja bem vindo a esse mundo externo, Davi! Davi, já te conto uma coisa: seus pais são maravilhosos e sua irmã é pura meiguice! ❤️ Beijos Fernanda Tavares

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